Por que as séries demoram tanto para voltar? Entenda os atrasos

Por que Stranger Things, Ruptura e outras séries demoram tanto para terem novos episódios? O público impaciente exige e nós explicamos.

Stranger Things

Depois da confirmação de que a última temporada de Stranger Things seria lançada em 2025, uma discussão foi reaquecida. Para muitos, a demora para o lançamento de novos episódios é muito grande. Jornalistas gringos já reclamaram na internet, exigindo que as séries sejam mais rápidas.

Em uma era de impaciência (nem falamos de imediatismo. É falta de paciência mesmo!), entende-se porque tanta gente reclama por esperar por uma nova temporada da sua série favorita. O problema, entretanto, é a falta de compreensão sobre dois pontos básicos nesta questão.

A primeira coisa que falta a quem critica a tal demora é a total ausência de noção e entendimento do processo de produção audiovisual. A segunda é a falta de senso crítico quanto ao contexto em que vivemos.

Primeiro, deixa eu te contar algo surpreendente: fazer uma série é difícil. Agora, deixa eu te falar outra coisa: os processos de produção de uma série são diferentes de outra. Dito isso, vamos desmembrar estas ideias e tentar entender porque um programa de 5 temporadas leva quase 10 anos para ser encerrado.

Outros tempos…

Antes de falar sobre as séries em si – e suas complexas produções – vamos trocar algumas palavras sobre contexto. Muita gente vociferou nos últimos dias a seguinte máxima: “antes as séries lançavam uma temporada nova por ano, com mais de 20 episódios por temporada.” Assim, como agora, com toda a tecnologia, os estúdios demoram tanto para lançar 8 episódios?

Saiba mais sobre Stranger Things:

Peguemos Lost como exemplo. A série lançava uma temporada a cada ano. Sempre com uma média superior a 20 capítulos por vez. O roteiro sempre era complexo e o elenco extenso. A série ainda foi abalada por uma greve de roteiristas, o que não impediu que 14 episódios fossem lançados para a 4ª temporada.

Calendários: o tempo da TV e o tempo do streaming

Para começar, Lost era exibida semanalmente em um canal de televisão, não um streaming (algo que nem existia na época). Além disso, grande parte do elenco assinava contratos para mais de uma temporada, e por um período de tempo que raramente dava espaço para outros projetos.

Assim, o estúdio tinha o elenco à disposição por bastante tempo, o que evitava atrasos. Além disso, o programa precisava respeitar, rigorosamente, um calendário televisivo. Em outras palavras, os canais decidiam, meses antes, quando e onde uma série seria encaixada. Assim, a produção tinha que fazer milagres para entregar seus episódios neste prazo. Do contrário, a programação inteira de um canal seria prejudicada.

Além disso, para muitos canais, um programa como Lost era a galinha dos ovos de ouro. Ou seja, era fonte de renda para milhares de pessoas envolvidas direta e indiretamente com a produção. Um canal como a ABC ou CBS tinha um número limitado de programas sendo exibidos anualmente.

Um novo jeito de fazer… TV?

Isso nos traz ao formato da Netflix ou Prime Video, por exemplo. A Netflix tem uma infinidade de programas sendo lançados a cada mês. A programação não precisa cumprir um horário específico. Se não lançarem uma série agora, outros sucessos suprirão essa falta. Se precisarem adiar um programa, isso acontecerá sem grandes problemas. Na TV, adiamentos eram quase impossíveis.

Neste sentido, discutimos outro ponto crucial: as emissoras de TV aberta ou fechada exibem as séries semanalmente. Em vários streamings, notavelmente a Netflix, as plataformas lançam as temporadas na íntegra.

Assim, quando exibem o primeiro episódio de Lost, Game of Thrones ou The Last of Us, por exemplo, é provável que a produção do último episódio ainda não esteja pronta. É normal que o sistema de produção comece a exibir uma temporada antes de finalizar todos os episódios. Ou seja: as equipes estão finalizando os episódios enquanto a exibição está acontecendo.

É preciso ficar claro que um filme ou uma série não são finalizados com tanta antecedência. Assim como nós, meros mortais, as equipes trabalham até o último minuto, quase na véspera, para entregar os resultados exigidos. Peter Jackson finalizou O Senhor dos Anéis poucas horas antes da pré-estreia. M. Night Shyamalan afirmou que a pós-produção de seu novo longa, Armadilha, acabou há poucos dias.

O filme estreia na semana que vem nos EUA.

Coisas estranhas e dragões

Como não poderia deixar de ser, com o surgimento da discussão veio uma disputa. Como o público adora colocar um programa contra o outro, logo surgiu o argumento: “Game of Thrones/House of the Dragon são complexas e voltam com mais rapidez que Stranger Things“.

Para começar, GoT e seu derivado são lançados semanalmente e precisam respeitar o calendário do canal. Antes de um ano começar, então, a HBO já sabe quais séries preencherão a sua programação. Todas as janelas de lançamentos já estavam definidas e a produção precisava se adequar a isso. Além disso, GoT é a maior propriedade do canal que, no momento, luta para encontrar um novo sucesso.

A plataforma só lança Stranger Things quando a série está inteiramente pronta. Então, você pode perguntar: “Por que Ruptura, que é lançada semanalmente, também está demorando?” Lembre-se que Ruptura também pertence a um streaming, tem um elenco estrelado (que participa de outros projetos) e enfrentou problemas internos em sua produção.

Como fazer sonhos

Isso nos leva a um divisor de águas: como estas séries são feitas? Para começar, comparar séries diferentes é burrice. O formato, o método, os motivos, problemas, verbas, equipes de House of the Dragon são totalmente diferentes de Stranger Things (ou Cobra Kai, Ruptura, Senhor dos Anéis, etc.)

Para começar, The Last of Us, Game of Thrones e House of the Dragon, por exemplo, são baseadas em outras mídias. O processo de adaptação, em tese, deve ser mais rápido. Afinal, já existe um material base e personagens prontos para serem desenvolvidos. Além disso, estas séries possuem salas de roteiristas, equipes dedicadas ao texto e à pré-produção.

Em Stranger Things e diversas séries de streaming, por exemplo, há apenas um/dois roteiristas ou uma equipe muito enxuta para escrever os textos. No caso de ST, os irmãos Duffer são showrunner centralizadores, que tendem a fazer várias coisas sozinhos. Isso acaba atrasando processos. Note, por exemplo, como a série da Netflix é escrita e dirigida por pouquíssima gente.

O elenco também define o ritmo das produções. Em Stranger Things o elenco não só participa de outros projetos (filmes, peças de teatro, livros, podcasts) como também era majoritariamente infantil. Ou seja: crianças, em produções audiovisuais americanas, podem trabalhar por períodos curtos de tempo, o que também é um empecilho.

Millie Bobby Brown fez alguns filmes e até lançou livro. Winona Ryder é uma atriz reconhecida e em breve lança Os Fantasmas Ainda se Divertem. Gaten Matarazzo estava em cartaz na Broadway. E no meio disso tudo havia uma greve!

Problema dos novos tempos

Mas vamos esquecer Stranger Things por um tempo. Não é nosso objetivo defendê-la ou justificar seus atrasos. Peguemos Ruptura, da Apple TV+. De produção caprichada, a série ainda conta com a direção requisitada de Ben Stiller. Além disso, grande parte do elenco é cobiçada em Hollywood. Para complicar tudo, esta é uma produção original que ainda teve brigas em seus bastidores.

Pachinko, também da Apple TV+, está demorando quase tanto tempo quanto Ruptura. Baseada em um livro, esta poderia ser uma produção mais fácil, certo? Em partes. A 2ª temporada será lançada em agosto, bem antes da 2ª de Ruptura. Ainda assim, precisamos atentar à complexidade da trama, que percorre vários países e continentes e conta com enorme elenco, dividido em várias linhas temporais.

O fato é que as séries estão cada vez maiores, mais complexas e mais bem produzidas. É hora de escolher: ou você quer a sua série rapidamente ou você a quer bem feita. Muitos dos programas atuais têm deixado o Cinema para trás em termos de qualidade técnica e visual. Antes, as séries saíam mais rápido, mas também não tinham o valor de produção dos dias atuais.

Tempos melhores?

Para encerrar, coloquemos a mão na consciência. Voltemos a Lost por alguns instantes. Lembra quando comentamos que a série tinha uma nova temporada por ano, sempre com mais de 20 episódios?

Pois é.

Artigos recentes, por exemplo, apontam que os bastidores da série eram caóticos e extremamente tóxicos. Os roteiristas não dormiam, não tinham folga, ganhavam muito pouco e ainda eram ab*sados/humilhados por seus chefes. Muitos da equipe, enfim, desistiram de trabalhar na indústria ou tiveram traumas severos.

Tudo para lhe entregar novos episódios a tempo.

Além disso, Supernatural também lançava uma temporada por ano. Quase 30 episódios. O preço disso? Nem todos os capítulos e nem todas as temporadas eram boas. E a dupla central de atores ficou limitada ao programa, sem conseguir trabalhar em outros projetos que poderiam lançar suas carreiras ainda melhor.

O mesmo serve para Grey’s Anatomy, há mais de 20 anos no ar. Alguns atores e roteiristas só conseguiram crescer depois que saíram da série. Isso porque no formato antigo de produção, não havia tempo, espaço e saúde para dar conta de tudo.

Não estamos afirmando que as produções de hoje são tranquilas e livres de incidentes. Mas parece que muitos conseguem trabalhar com o mínimo de dignidade.

A nós, resta esperar. Só esperar.

Sobre o autor
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Matheus Pereira

Coordenação editorial

Matheus Pereira é Jornalista e mora em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Depois de quase seguir carreira na Arquitetura, enveredou para o campo da Comunicação, pelo qual sempre nutriu grande paixão. Escritor assíduo na época dos blogs, Matheus desenvolveu seus textos e conhecimentos em Cinema e TV numa experiência que já soma quase 15 anos. Destes, quase dez são dedicados ao Mix de Séries. No Mix, onde é redator desde 2014, já escreveu inúmeras resenhas, notícias, criou e desenvolveu colunas e aperfeiçoou seus conhecimentos televisivos. Sempre versando pelo senso crítico e pela riqueza da informação, já cobriu eventos, acompanha premiações, as notícias mais quentes e joga luz em nomes e produções que muitas vezes estão fora dos grandes holofotes. Além disso, trabalha há mais de dez anos no campo da comunicação e marketing educacional, sendo assessor de imprensa e publicidade em grandes escolas e instituições de ensino. Assim, se divide entre dois pilares que representam a sua carreira: de um lado, a educação; de outro, as séries de TV e o Cinema.

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